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Uma obra inédita no Mundo
2007-10-09 14:18:58

A Igreja da Santíssima Trindade, a inaugurar sexta-feira, é uma obra única no Mundo. Hoje, quando a empresa construtora entregar as chaves do novo edifício à reitoria do Santuário, dar-se-á por terminado um projecto impar em muitos aspectos: desde a sua dimensão aos materiais utilizados, à decoração com obras de arte de autores de reconhecido valor, ao investimento e às soluções arquitectónicas conseguidas.

A dimensão do edifício é o primeiro aspecto que salta à vista. São 38 mil metros quadrados de área bruta de construção e 18 metros de altura, onde há lugares sentados para quase nove mil fiéis, numa assembleia circular com 125 metros de diâmetro, sem uma única coluna interior que prejudique a visibilidade para o altar entre os crentes.

O objectivo do autor do projecto, o arquitecto grego Alexandros Tombazis, era o de que “a assembleia se visse a si mesma para favorecer a sensação de se estar em comunhão fraterna”. Esse aspecto, a par da luz natural que ilumina todo o espaço da assembleia, permitiu criar um ambiente singular, que apela à meditação, à oração e ao recolhimento.

A parede de fundo do presbitério da Igreja é preenchida com o maior painel do Mundo em azulejo, que merece um olhar atento e demorado. Da autoria do esloveno Marko Ivan Rupnik, tem 500 metros quadrados em que predomina o tom dourado e moldado à mão em quatro diferentes tipos de ouro. A colocação do painel prolongou-se por três meses e foi assegurada por uma equipa de 20 especialistas em arte litúrgica oriundos de oito países. O altar ostenta ainda um crucifixo enorme da autoria da irlandesa Catherine Green e uma imagem em mármore de Nossa Senhora de Fátima de mãos abertas, desenhada pelo italiano Benedetto Pietogrande.

No exterior, a 21 metros de altura, salientam-se as duas vigas paralelas em betão branco que suportam toda a estrutura, com 182 metros de comprimento e dois metros de largura. São ocas e pelo seu interior passam todas as tubagens do edifício, possibilitando andar em pé lá dentro.

O custo total – incluindo o mobiliário e obras de arte da Igreja e ainda o túnel rodoviário – deverá atingir os 80 milhões de euros, o dobro da verba prevista de início. O reitor do Santuário de Fátima, monsenhor Luciano Guerra, espera “publicar as contas” e garante que a construção foi financiada com as ofertas dos peregrinos.

PORMENORES

FORMA DE BARCO

O Santuário de Fátima tem uma forma comparável a um barco, com a proa na basílica, a popa na nova igreja e o corpo no recinto de oração, que continua a ser o espaço nobre.

CULTO A PASTORINHOS

A actual basílica deve permanecer como ‘ponto alto’ do conjunto de património edificado, destinando-se ao culto dos Pastorinhos, cujos corpos estão sepultados no seu interior.

TRABALHADORES

Os 3500 trabalhadores envolvidos na construção da obra vão ter o seu nome escrito na nova igreja. Além disso, serão alvo de uma celebração, agendada para o próximo dia 20.

INQUÉRITO

Mais de 80 por cento dos peregrinos, que aceitaram preencher um inquérito elaborado pelo Santuário, concordaram e “acolheram com agrado” a construção da nova igreja, que permitirá acolher os peregrinos durante o Inverno.

SIZA VIEIRA E OS APÓSTOLOS

No átrio dos apóstolos S. Pedro e S. Paulo, que dá acesso às capelas da reconciliação e fica num piso inferior ao recinto, destaca-se um mural em azulejo com mais de 100 metros de comprimento, no qual o arquitecto Siza Vieira desenhou as silhuetas dos apóstolos. A nova Igreja foi construída de frente para a Basílica, fechando o espaço do recinto de oração e conferindo-lhe uma dimensão de intimidade.

"OS PROJECTOS RELIGIOSOS EVOLUEM DE FORMA MAIS LENTA" (Alexandros Tombazis, arquitecto grego, autor do projecto da nova igreja)

CM – Este projecto foi importante para si?

Alexandros Tombazis – As religiões têm mais coisas em comum do que diferenças, pelo que o templo procura ser um reflexo do diálogo artístico entre várias culturas. Para mim, foi um projecto importante, por ser em Fátima e porque uma igreja é o projecto de edifício mais abstracto, onde a espiritualidade que deve emanar é tão importante como a função. Tem um ambiente suave, calmo, propício à concentração.

– Mas este projecto é muito diferente dos das igrejas a que estamos habituados?

– Eu acredito que a arquitectura é a expressão da vida, mas os projectos religiosos evoluem de forma mais lenta. Mas este já é um edifício preocupado com o desenvolvimento sustentável, que minimiza a perda de energia e inclui preocupações ambientais claras.

– Esta igreja não vai sobrepor-se à basílica original?

– Ela não quer ser competitiva em relação à existente, daí o edifício ter ficado parcialmente enterrado. Este é um espaço muito horizontal, neutral em relação à área de oração e à avenida circundante. Acredito até que a igreja cria um diálogo com a basílica.

– O senhor, de nacionalidade grega, é ortodoxo. Este facto causou-lhe alguma dificuldade?

– Não houve nenhum problema no facto de um ortodoxo projectar a nova igreja em Fátima. A minha relação com o Santuário já vai em dez anos e fico satisfeito pela experiência de ter lidado com estas pessoas. A escolha dos símbolos ortodoxos foi um pedido do Santuário, que queria abrir o templo à tradição oriental.

– Acredita que os fiéis vão entender a sua obra?

– Penso que o público em geral vai perceber que a arte é a expressão da vida, que evolui. A espiritualidade do espaço, a noção da abstracção, da espiritualidade, torna tudo muito desafiante.

LUMINOSIDADE ESTÁVEL

“Historicamente, a Igreja Católica nunca chamou a si um estilo próprio em termos arquitectónicos. A actual basílica de Fátima, por exemplo, foi terminada em 1952 e nessa altura já não era um estilo próprio da Europa, nem contemporâneo. A Igreja de santíssima Trindade tem uma linguagem actual”, diz o arquitecto Erich Corsépius, director do Serviço de Ambiente e Construções (SEAC) do Santuário.

Na nova igreja, o que mais agrada ao arquitecto é “a luz, que é toda zenital, tanto diurna como nocturna. É possível manter o mesmo nível luminoso quer apareçam nuvens ou não. Tem até um programa de lumotecnia, o que não é usual. Depois ressalta a unidade da assembleia, que nos diz que somos uma parcela do todo. E a acústica”.

No futuro, a Igreja da Santíssima Trindade – que é inaugurada na sexta-feira – aproveitará também a energia solar. A obra está preparada para esse efeito, mas os painéis ainda não foram colocados.

Segundo Erich Corsépius, “o problema reside numa questão legal. Nós pedimos licença para 400 Kw e só nos deram autorização para 100 Kw, para poder haver incentivos financeiros”.

ANTIGA BASÍLICA GUARDA PASTORINHOS

A Basílica de Fátima, onde repousam os restos mortais dos três Pastorinhos, começou a ser construída em 1928. A primeira pedra foi benzida a13 de Maio desse ano pelo arcebispo de Évora, D. Manuel da Conceição Santos. Os trabalhos de construção terminaram em finais da década de quarenta.

Em 1951, recebeu os restos mortais de Jacinta e, no ano seguinte, de Francisco. A sagração ocorreu a 7 de Outubro de 1953 e o título de “Basílica” foi-lhe concedido por Pio XII, em Novembro de 1954. O edifício, que mede 70,5 metros de comprimento e 37 de largura, foi construído com pedra da região e os altares são de mármore de Estremoz, de Pero Pinheiro e de Fátima. A torre sineira tem 65 metros de altura e é rematada por uma coroa de bronze de 7 mil quilos, construída na Fundição do Bolhão, Porto.

O último acontecimento que marca a história da basílica ocorreu a 19 de Fevereiro de 2006, data da trasladação do corpo da Irmã Lúcia do Convento de Santa Teresa, Coimbra, para o Santuário.

NOTAS

NOVO TEMPLO FOI PENSADO HÁ 20 ANOS

A ideia de construir uma nova igreja no Santuário de Fátima surgiu há 20 anos, quando os responsáveis da Cova da Iria constataram que a actual basílica, inaugurada há 54 anos, era pequena para acolher tantos peregrinos.

INAUGURAÇÃO COM ATRASO DE SEIS MESES

A construção da Igreja iniciou-se a 2 de Fevereiro de 2004. Era objectivo do Santuário que fosse inaugurada a 13 de Maio deste ano, 90.º aniversário da primeira aparição. Atrasos vários adiaram a abertura para 12 de Outubro.

COMODIDADE E SEGURANÇA

Tanto os acessos como o pavimento interior são em rampa, sem degraus. Quando for construído o túnel para veículos sob a avenida, surgirá uma vasta praça para peões, desde a Basílica até ao Centro Pastoral Paulo VI.

TERRAS E ESTRUTURA DE BETÃO ARMADO

No final de 2004, passados praticamente 11 meses após o início da primeira fase de construção, estava concluída a movimentação de terras e executados 40 por cento dos trabalhos da estrutura em betão armado.

ARTISTAS DE RENOME INTERNACIONAL

Artistas de renome internacional e de vários países estão responsáveis pela concretização das principais peças iconográficas da nova igreja, entre os quais Siza Vieira, a irlandesa Catherine Green e o polaco Czeslaw Dzwigaj.

VISITA DE MINISTRO DO TURISMO

Telmo Correia foi o primeiro membro do Governo a visitar a obra, a 27 de Dezembro de 2004. O ex-dirigente do CDS-PP era, na altura, ministro do Turismo do Executivo liderado pelo social-democrata Pedro Santana Lopes.

Isabel Jordão, Leiria / C.F. / F. P.

Fonte CM

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