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Não queremos fazer gente capada - D. Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa
2006-09-25 21:58:48

A Igreja tem de falar claro, sem rodeios e dizer frontalmente que o Papa não fez nenhum ataque ao Islão nem aos muçulmanos. Deve realçar, sobretudo, que Bento XVI lançou um aviso sério aos políticos ocidentais: os líderes da Europa têm de pensar o Islão.

Com serenidade, é certo, mas têm de pensá-lo.” D. Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa e porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), reafirmou ontem ao Correio da Manhã a ideia forte que tinha deixado no final das Jornadas da Comunicação Social, em Fátima, sobre a recente polémica provocada pelas palavras do Papa na Universidade de Ratisbona, na Alemanha, referindo: “Acho que as pessoas são naturalmente violentas, quer sejam religiosas ou não religiosas. A agressividade e a sexualidade são as duas grandes energias do ser humano e existem em toda a gente; não queremos com a religião fazer gente capada e anestesiada.” E explicou também que as verdades não podem deixar de ser ditas, por muito duras que sejam as palavras e que, naturalmente, esta declaração tem de ser contextualizada, “sob pena de acontecer o que aconteceu ao Santo Padre com a citação do imperador Manuel II”.

“O homem possui naturalmente as energias da violência e da sexualidade, e Deus, que é um factor de harmonia, faz convergir essas energias para o bem”, disse D. Carlos Azevedo, sublinhando que “as energias não são boas nem más, podem é ser bem ou mal conduzidas”.

Sublinhando que o alerta do Papa deve ser levado muito a sério, D. Carlos Azevedo disse ao CM que, “se os líderes ocidentais não quiserem ser surpreendidos pelo tão falado choque de civilizações, têm de o preparar. O Islão deve ser encarado com um diálogo verdadeiro e frontal e não com medo e hipocrisia como os políticos europeus e ocidentais têm feito até agora”.

Numa linha de frontalidade, que, com a nomeação de alguns dos novos bispos, a Igreja tem vindo a adoptar em Portugal, o porta-voz da CEP sublinhou que “não deve haver medo das palavras nem de debater frontalmente as ideias”.

“Nós não podemos ter receio de dizer que é mau espalhar a fé com a espada, até porque sabemos muito bem do que estamos a falar. A Igreja Católica também já cometeu esse erro, mas corrigiu-se, arrepiou caminho e até já pediu perdão [João Paulo II] pelos excessos cometidos na Idade Média e na Inquisição”, sublinhou o prelado.

D. Carlos Azevedo louvou também a “coragem” de Durão Barroso (ver texto na outra página), que veio a público dizer que os líderes europeus deviam apoiar mais o Papa.

“O presidente da Comissão Europeia está a ver largo. Já percebeu que estão todos a tentar resolver os pequenos problemas do imediato, não fazendo nada que possa evitar grandes problemas no futuro”, disse ao CM o bispo auxiliar de Lisboa.

Nesta linha de pensamento, o prelado alertou também para o facto de esta postura de ‘marketing político’ dos líderes europeus estar a contribuir para o aparecimento de regimes totalitários.

“É ver o que se passou recentemente em Paris. Os jovens são vulneráveis, não têm princípios sólidos nem estrutura de pensamento e basta aparecer um louco a dizer o que eles querem ouvir e eles seguem-no”, avisou D. Carlos Azevedo.

PERFIL

Carlos Alberto de Pinho Moreira de Azevedo é bispo titular de Belali e auxiliar de Lisboa. Nasceu em Milheirós de Poiares, Santa Maria da Feira, há 53 anos.

Estudou nos Seminários do Porto e no Instituto de Ciências Humanas e Teológicas. Doutorou-se em 1986, na Faculdade de História Eclesiástica da Universidade Gregoriana, em Roma. Foi ordenado sacerdote em Julho de 1977 e é, actualmente, o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa. É também professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica ortuguesa, desde 1987.

Entre as muitas obras publicadas destaca-se a direcção do monumental ‘Dicionário de História Religiosa de Portugal’, em quatro volumes.

MENOS SEMINARISTAS

O Seminário Maior de Braga (Teologia) abre hoje as portas com menos 20 por cento dos alunos do ano passado. No ano lectivo 2005/06 frequentaram o seminário 59 alunos, contra os 47 inscritos este ano. Admitindo que “existe, de facto, uma quebra”, o reitor do seminário, cónego José Paulo Abreu, disse que “o seminário é uma caminhada e não uma meta. É um discernimento vocacional e é normal que haja desistências”. Para inverter esta situação, os responsáveis eclesiásticos vão tentar aproximar o seminário das paróquias.

MUÇULMANOS EM ROMA

O Papa Bento XVI recebe hoje os embaixadores de países muçulmanos junto da Santa Sé e representantes islamitas em Itália. A audiência realiza-se em Castel Gandolfo, perto de Roma. Segundo a agência Ansa, 20 embaixadores ou encarregados de negócios vão estar presentes. O encontro abre com um discurso de monsenhor Paul Poupard, presidente do Conselho Pontifical para o Diálogo Inter-Religioso, seguindo-se uma intervenção do Papa. O cardeal diz não se lembrar de uma iniciativa idêntica nos últimos dez anos.

BARROSO QUER EUROPA AO LADO DO PAPA

O presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, afirmou, em entrevista publicada ontem num jornal alemão, que os líderes europeus deveriam ter saído em defesa do Papa Bento XVI na polémica dos comentários sobre o Islão. Uma reacção, adianta, que pode ter sido motivada pelo “politicamente correcto” ou “por receios de uma possível confrontação”.

Para Durão Barroso, o problema que se gerou não está nas afirmações do Papa mas sim nas reacções de extremistas muçulmanos, com actos de violência. “Fiquei desapontado por não terem surgido mais líderes europeus que dissessem que o Papa tem o direito de expressar as suas opiniões”, disse o presidente da Comissão Europeia ao ‘Welt am Sonntag’.

“O problema não foi o discurso do Papa, mas sim as reacções dos extremistas”, acentuou: “Temos de defender os nossos valores.”

A raiz cristã da identidade cultural da Europa foi um dos pontos controversos da proposta de Constituição Europeia. A versão final não lhe fazia referência. Depois de rejeitada em França e na Holanda, a Constituição foi posta ‘na gaveta’, para ser repensada. Vai voltar à agenda durante a presidência portuguesa da UE, já para o ano.

Secundino Cunha

Fonte CM

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