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Os caminhos interditos do sincretismo religioso
2004-01-31 11:54:35

O especialista belga em filosofias orientais e dos esoterismos, Pe. Joseph Marie Verlinde, é uma das figuras de proa, na Europa, dentro da luta contra as “sabedorias orientais”.

À Agência ECCLESIA fala sobre a importância do fenómeno da New Age, na sua incompatibilidade com o cristianismo e sobre o seu próprio percurso de vida.


Antes de se converter ao catolicismo, percorreu os caminhos da Meditação Transcendental, tendo seguido Maharshi Mahesh Yogi e sido admitido como seu discípulo nos ashrams dos Himalaias. Mesmo após a sua conversão frequentou escolas de esoterismo, na esperança de integrar a sua experiência no Oriente com a figura de Jesus, mas abandonou essa pretensão e, após o que denomina de “caminho de cura interior”, foi ordenado.
O sacerdote escreveu, entre outras obras, “A divindade sem nome e sem rosto”, “O cristianismo e o desafio das novas religiosidades”, “Cem questões sobre as novas religiosidades” e “Percursos de cura interior pela escuta da Palavra”.

Agência ECCLESIA – Tem um itinerário interior muito particular. Como é que veio encontrar Jesus Cristo?
Pe. Joseph Marie Verlinde – Fiz parte da geração de ‘68 (tinha na altura 21 anos, ndr), que contestou tudo o que era tradicional e qualquer forma de autoridade. Renunciei à Fé, não tinha nenhuma razão para abandonar Jesus Cristo a não ser obedecer aos slogans filosóficos da época.

AE – Disse abandonar e não perder a Fé. É diferente?
JMV – É diferente, porque foi uma decisão de romper com a minha tradição religiosa, foi um momento muito duro. Queria ser plenamente livre, como se dizia.

AE – Frutos de uma ideologia política?
JMV – Política, filosófica, a que eu era mais sensível. Eu não tinha argumentos para contestar o reducionismo de algumas correntes, a contestação teológica, pelo que procurei dar um sentido à minha vida a partir da pesquisa científica.
A dimensão espiritual, porém, estava sempre presente e decidi seguir Maharshi Mahesh Yogi, mestre da meditação transcendental, e era claro que tinha um efeito – um caminho de interioridade -, mas agora que revejo essa parte da minha vida é incontestável que estava um pouco perdido.

AE – Não havia nenhuma referência pessoal a Deus?
JMV – Bom, seria preciso perceber de que interioridade se fala quando abordamos este tipo de percursos. Encontrei um guru e tornei-me seu discípulo nos ashrams dos Himalaias, onde fiquei com ele 4 anos.
Aprofundei todos os aspectos, teóricos e práticos, do Yoga e tive a experiência de mergulhar naquilo que considerávamos como a divindade – mas ficou evidente a diferença entre a interioridade cristã e a hindu.

AE – Onde estão essas diferenças?
JMV – Penso que a interioridade hindu, segundo a expressão de Mircea Eliade, é uma “instase”, enquanto o cristianismo é sair do êxtase em direcção a Deus, que vem até mim na pessoa de Cristo.
O encontro, a comunhão de amor, são elementos fundamentais na nossa religião, enquanto que no Oriente o caminho interior não provoca o encontro com ninguém, deseja a “não-existência”.

AE – Como se fez a passagem desta sua situação para o encontro com Jesus Cristo?
JMV – Fez-se de uma maneira verdadeiramente desconcertante, porque nunca pensei que após um corte tão radical pudesse regressar ao cristianismo.
Acontece que, um dia, alguém me perguntou se tinha sido cristão e o que é que Cristo se tinha tornado para mim. Só mais tarde é que percebi que esta é a questão central dos Evangelhos, o que dizemos nós que é Jesus.
A partir daí, foi como se esta pergunta tivesse feito crescer em mim o “selo” do Baptismo, a memória de Jesus. Depois tive a experiência de sentir que Ele estava lá, ao pé de mim, e que permaneceu fiel, seguiu-me.

AE – Abandonou todos os seus planos?
JMV – O reencontro foi tão forte que não podia duvidar, por um instante, que me tinha deparado com Cristo. Portanto, encontrara o que sempre procurei e não tinha motivos para continuar longe da minha terra.

AE – Foi um encontro interior?
JMV – Um encontro interior, mas com uma alteridade. A experiência interior do Oriente não é um encontro, é um vazio; o encontro com Cristo é um encontro com uma pessoa que me ama incondicionalmente e esperava que eu me voltasse para Ele.
A conversão, percebi então, mais não é do que “voltar-se em direcção a Ele”, Deus espera que eu. Para mim foi evidente que era Jesus, mas não sei dizer porquê.

AE – Recomeçou noutro caminho, o sacerdócio?
JMV – O sacerdócio que morava no meu coração desde que era pequeno, pelo que quando reencontrei Jesus Cristo foi uma escolha evidente. Procurei alguém que me pudesse compreender, que não achasse que eu era doido pela minha experiência de via.
A determinado momento encontrei o que queria, num grupo de pessoas que falava dos Evangelhos, mas que falava de coisas que conheci nas montanhas: as energias, a reencarnação: uma escola esotérica, crística, não cristã. Achei que podia ligar o antigo e o novo, o hinduísmo e o cristianismo, mas como não conhecia o Evangelho achei que estava no bom caminho e cheguei mesmo a ser introduzido nos ritos ocultos.
Porém, quando comecei a ouvir coisas bizarras, exteriores, percebi que era necessário afastar-me. Tive a experiência de ouvir vozes, “espíritos”, mesmo durante celebrações litúrgicas, e procurei ajuda junto de um sacerdote que, curiosamente, era o exorcista da Diocese.
Reconheço que agi, pratiquei ciências ocultas, onde me fiz ajudar por entidades ocultas para obter resultados. Após abandonar tudo isso fui capaz de começar os estudos, 10 anos no seminário, para pôr as minhas ideias em ordem, foi um tempo de “cura interior” (o Pe. Verlinde foi ordenado em 1983).

CONTRA O SINCRETISMO
A corrente New Age tem assumido grande influencia na cultura actual, especialmente no que se refere à cultura dos sectores mais jovens da população e nos meios universitários, como iniciação e encorajamento aos sincretismos religiosos e aos esoterismos.

AE – A Fé tradicional está povoada, hoje em dia, de expressões esotéricas, bizarras. Que análise é possível fazer deste sincretismo?
JMV – Penso que sou um bom exemplo do que se passou nos anos60-80. Agora, passámos de um paradigma para outro, do “judeo-cristão” para um mundo que tenta misturar caminhos antigos com os modernos.
Hoje em dia há um quadro de pensamento que não se dá conta de que é incompatível crer ao mesmo tempo na reencarnação e na ressurreição!

AE – Onde está o centro do problema?
JMV – Quem diz “acredito em Jesus Cristo, Filho de Deus Salvador”, que acredita que Ele é o Verbo de Deus feito carne, que recapitula todos os homens em si, não há razão para incorporar-me noutras correntes, não se pode jogar dos dois lados.
Há alguma coisa de parasitário no “New Age”, por exemplo.

AE – A Igreja ainda não tem resposta para as questões ocultas da pessoa humana?
JMV – Para mim é claro que tem respostas, acontece é que quando se ouve na resposta da Igreja o termo “mistério”, vamos procurar no secreto.
O drama, hoje em dia, é que os nossos contemporâneos não querem voltar à Igreja depois da ruptura. Eu, quando regressei, fiquei maravilhado!
Aquilo que se propõe no cristianismo é fabuloso e eu tive de reconhecer que não o conhecia, quando me aventurei nos caminhos do hinduísmo e do budismo.

AE – Há necessidade falar do “mistério”?
JMV – Muita gente fala da Bíblia como se ela não conhecesse as “coisas ocultas”, por exemplo, mas penso que não é lógico que os autores bíblicos ignorassem o mundo oculto.
Eles conheciam as doutrinas da época, os cultos mágicos e mistéricos, se não falam deles é porque querem deixar uma mensagem: todos esses conhecimentos, secretos e esotéricos, fazem parte do nosso mundo, do mundo criado, e não é por ele que vamos chegar a Deus. É pela Revelação Divina.

AE – E é possível dialogar com os seguidores deste cultos?
JMV – As grandes tradições religiosas são caminhos por onde o homem procurou Deus, mas na plenitude dos tempos Ele manifestou-se em Jesus. Logo, o diálogo baseia-se no respeito, nos traços de verdade que possam existir nessas tradições.
Muito mais delicada é a questão da “New Age”, porque ela tem um carácter parasitário, não é filosofia nem teologia, é um movimento muito vago que assume elementos de várias tradições.
O seu problema é a “confusão”, o não saber quem é o interlocutor. Não nenhuma face claramente definida, é preciso exigir, em primeiro lugar, que ela se clarifique, senão é impossível dialogar.

Fonte Ecclesia

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