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Humanismo de um Papa
2003-10-16 00:47:57

Agência Ecclesia – João Paulo II marca a agenda da comunidade internacional?
Aura Miguel – Desde há 25 anos! A sua eleição instaurou um novo estilo de pontificado, definido por ele próprio como um pontificado itinerante. João Paulo II afirma a consciência de ser fundamental correr o mundo - como fez S. Paulo no seu tempo. Quando o Papa fez a sua 100ª viagem explicou que se propôs seguir os passos do apóstolo de que ele é herdeiro. Isto para além de motivações das Igrejas que o recebem (que abrange todos os sectores da realidade, também política).


AE – Há a planificação de iniciativas, nomeadamente viagens, que possam influenciar decididamente a história?
AM – As marcações das viagens resultam sempre de convites dos Bispos que visita e tendo em conta as necessidades pastorais das Igrejas a visitar. Para quem convida, admito que obedeça a uma determinada estratégia: “dá jeito” aos bispos que o Papa visite as suas igrejas locais, a interesses políticos e partidários… Recordo-me, por exemplo, do convite a visitar Cuba… certamente que Putin gostaria de ver o Papa na Rússia por motivos que não são os do Papa: o único critério é pastoral. Agora, que por causa de determinada viagem o mundo mude, a história do país, do continente ou até mundial, é possível. Mas o Papa não promove viagens com essa intenção. Faz para anunciar Cristo, cumprindo o que afirmou no início do seu pontificado: “Abri as portas a Cristo, nos sistemas políticos, económicos e culturais”. Abrindo as portas a Cristo, muda o mundo!

AE – As viagens ao Leste da Europa, nomeadamente, poderemos encontrar nelas um plano que conduza à abertura do leste ao mundo democrático?
AM – De certo modo sim. É verdade que a primeira visita à Polónia foi muito “negociada”. O fio condutor é sempre “abri as portas a Cristo”. Isso implica que Cristo esteja em todas as dimensões do homem, nomeadamente onde ele ainda não esteja.
A insistência de João Paulo II em ir à Polónia levou ao “abrir as portas a Cristo” antes de mais dos polacos e, depois, do mundo do leste. Cristo é o Senhor da História. Se lhe abrirmos as portas, ele muda-a. As iniciativas de João Paulo, o desejo de viajar, foram um instrumento fundamental para esta mudança.
Não se pode trocar a ordem dos factores: porque causa da convicção e profunda determinação de que Cristo ressuscitou e, portanto, é a resposta aos anseios do coração do homem, dos povos e das nações que o Papa viaja. E ficou demonstrado que, assim, consegue mudar a história.

AE – Karol Wojtyla é um líder religioso da passagem do milénio?
AM – Sem dúvida. Mesmo para os que não têm religião, João Paulo II é uma grande autoridade moral. Ele vive com tanta verdade e com tanta convicção, ele é tão credível no seu próprio exemplo pessoal que se torna irresistível para qualquer pessoa, independentemente de ser cristão, católico, de outra religião ou para os que não crêem em Deus. É muito evidente o respeito e a autoridade moral que ele tem, em certo sentido, “anterior” ao facto religioso. É algo inegável pela riqueza e pela grandeza do que ele é como pessoa. É um homem fora de série, reconhecido por pessoas independentemente da religião.
Enquanto líder religioso é a única personalidade do mundo – como lhe disse um líder judaico no II Encontro de Assis – que consegue reunir líderes religiosos de todo o mundo, após acontecimentos como o 11 de Setembro, num grande grito ao mundo a favor da paz e afirmando que a religião nunca poderia ser factor de guerra.
Houve muitas vozes que, na altura em que convocou o II Encontro de Assis, temeram que não corresse tão bem como o Encontro de 86 em que se vivia um ambiente de “guerra santa”. Mas a única coisa que não correu bem foi que, no momento da paz, os líderes religiosos em vez de dar um abraço ao vizinho foram todos dar um abraço ao Papa: o maior sinal de que João Paulo II é um líder religioso.

AE – Política e socialmente também?
AM – Correndo o risco de simplificar, acho que política e socialmente também. Do ponto de vista social, bastará olhar para os seus documentos e vemos como norteiam todos aqueles que têm preocupações de valorizar o homem e a dignidade do trabalho. Também por causa da sua experiência de vida na juventude e da realidade dura do trabalho que experimentou – na sequência de extraordinários documentos sobre a Doutrina Social da Igreja de Papas anteriores – as encíclicas e outros documentos dedicados à Doutrina Social de João Paulo II têm sido de uma grande luminosidade, ajudante a consolidar toda a doutrina social da Igreja que já existia antes deste pontificado.
Do ponto de vista político… basta ver a preocupação e a tentativa contínua de manipulação que os políticos fazem das palavras do Papa. Cuba é um exemplo. Foi uma visita difícil de negociar, apesar do interesse de Fidel: interessou-lhe que os olhos do mundo estivessem postos em Cuba que recebia o Papa, mas não queria, por exemplo, que os discursos do Papa fossem transmitidos em directo…

AE – Será difícil fazer a história deste Papa, classificando-o, em poucas palavras. Mas, qual será, para uma jornalista que o acompanha com frequência, o primeiro atributo de João Paulo II?
AM – É impossível, para mim, classificar este pontificado!... De imediato, olho-o com profunda humanidade.
Não gosto de o ver como um homem religioso, que o é claramente, como um homem de oração, de inteligência, de cultura… etc. O que mais me impressiona é a sua profunda humanidade. A sua humanidade é tão extraordinária que, acho, é esse o segredo da sua atractividade. É a única coisa que explica que jovens continuem atraídos por João Paulo II, apesar das evidentes fragilidades. Por exemplo, na recente visita à Eslováquia, ele estava praticamente imobilizado, praticamente sem poder mexer nem falar, as pessoas estavam aos milhares numa celebração comovidas e gratas pela presença daquele Papa, que reflecte humanidade.
Para mim, a melhor síntese foi encontrada pelo cardeal Ratzinguer quando disse ao Papa, no dia do seu aniversário, que ele é o reflexo do rosto de Cristo. O rosto de Cristo que o Papa sempre nos convida a fixar o olhar… João Paulo II já é o reflexo deste rosto. E por isso é que ele é tão fascinante e tão atractivo: porque Cristo é profundamente humano.

Fonte Ecclesia

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