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Mensagem do Cardeal Patriarca de Lisboa
2001-02-21 19:19:56

1- A Quaresma, enquanto preparação intensa do mistério pascal, é sempre um tempo especial de graça e de conversão. A Quaresma deste ano tem de ser, necessariamente, a continuação do tempo jubilar. A Carta Apostólica "Novo Millenio Ineunte", do Santo Padre João Paulo II, poderá constituir o nosso guia, os seus desafios o nosso compromisso, as suas sugestões o nosso itinerário. Continuação da graça jubilar, a Quaresma deve ser tempo de conversão e de esforço de fidelidade.

O grande desafio da Carta Apostólica é o da radicalidade evangélica, na fidelidade a Jesus Cristo, o aceitar a existência cristã como um peregrinar, cuja meta é a santidade. Diz-nos o Santo Padre que não nos podemos contentar com uma prática religiosa rotineira, com uma moralidade pouco exigente. Ser cristão é seguir Jesus como discípulos, abraçar com Ele, por amor, a exigência da cruz, na esperança de participar, com Ele, na plenitude de vida que a sua ressurreição inaugurou e de que recebemos já as primícias, na força do Espírito Santo, que nos conforta e fortalece. "Faz-te ao largo", é o desafio que a Carta Apostólica faz à Igreja. Sejamos exigentes e ousados nas metas que traçamos para a nossa vivência quaresmal.

2- Contemplar o rosto de Cristo: um encontro mais profundo com o mistério de Jesus Cristo é o legado precioso do Grande Jubileu. O Santo Padre ao significar esta exigência da autenticidade cristã com o convite de contemplar o seu rosto, acentua a dimensão inter-pessoal da nossa relação com Ele. Cristo é uma pessoa viva, uma pessoa humana e divina, que nos conhece, nos ama e tem para todos nós um desígnio de amor. É possível fixar o seu olhar, escutar a sua Palavra, conhecê-Lo melhor numa intimidade amorosa, unir-se a Ele numa relação vital, viver com a autenticidade que nos sugere, oferecer, com Ele, a própria vida em acto de louvor a Deus Pai e em oferta sacrificial para a redenção do mundo.
Quais são os caminhos quaresmais para este encontro mais profundo com Cristo? O primeiro, que engloba todos os outros, é o nosso baptismo. A Quaresma é um tempo particularmente baptismal, de preparação para os catecúmenos que se baptizarão na Páscoa, de revivência para todos os baptizados. O baptismo, na sua eficácia permanente, encerra uma graça própria de identificação com Cristo.

2- Escutar a sua Palavra. A pedagogia da Quaresma é profundamente marcada pela escuta da Palavra. A sua Palavra é mensagem do próprio Deus, para toda a Igreja e para cada um de nós. Como nos fala, hoje, Jesus Cristo? Antes de mais através da Sagrada Escritura. Como diz o Santo Padre, "desconhecer a Escritura é desconhecer o próprio Cristo". Sejamos inventivos e generosos, encontrando modos de escutar e interiorizar a Palavra de Deus. Ela escuta-se e acolhe-se em oração, pois é uma atitude de um Deus que quer fazer comunhão connosco. A própria liturgia nos oferece os textos principais de um itinerário de salvação. Escutemo-la em comunidade, em grupo, em família, através do método da "lectio divina" e interiorizemo-la pessoalmente, no silêncio do nosso coração.

3- O esforço da oração: a oração é o fruto e o ambiente da escuta da Palavra. É uma experiência constitutiva da seriedade da vida cristã. O Santo Padre avisa-nos de que um cristão que não reza, não é apenas um cristão medíocre, é um cristão em perigo. A oração é um exercício principal na vivência da Quaresma. É preciso dar prioridade à oração litúrgica comunitária. A Eucaristia é o momento mais importante da oração da Igreja, pois nela a oração de louvor a Deus, Trindade Santíssima, encontra a sua forma mais perfeita, pois a Igreja participa do próprio louvor de Jesus Cristo a Deus, seu Pai. Seria importante que as comunidade, as famílias, se habituassem a celebrar a liturgia das horas, sobretudo a oração de Laudes e de Vésperas.

4- A conversão e a penitência: a Quaresma é um tempo de conversão, que há-de ser o fruto da oração e da escuta da Palavra. Converter-se é regressar ao Senhor, à sua intimidade, à obediência à sua vontade, à vida da graça que iniciámos no baptismo. É o regresso do filho pródigo, cuja caminhada continua na peregrinação do discípulo. O caminho da conversão é muito facilitado recorrendo ao Sacramento da Reconciliação, manifestação do amor misericordioso de Deus. Peço aos sacerdotes que se disponibilizem e valorizem pastoralmente a vivência deste sacramento, que sendo atitude individual e pessoal, é espiritualmente muito valorizado com a celebração comunitária da penitência. Na Carta Apostólica, o Santo Padre lembra-nos que a confissão individual é o meio habitual para obter o perdão dos pecados graves cometidos depois do baptismo. Na actual disciplina da Igreja acerca dos Sacramentos, não se pode considerar a absolvição geral, antes da confissão individual dos pecados, uma solução pastoral habitual. A sua prática excepcional deve obedecer às condições previstas no Código de Direito Canónico.
A valorização pastoral deste sacramento depende muito da qualidade da oração e da escuta da Palavra de Deus. Ele é um acto de fé na bondade misericordiosa de Deus e no ministério da Igreja, enquanto mediadora da graça.

5- Uma "nova fantasia" da caridade: a expressão de João Paulo II na Carta Apostólica. Desafio post-jubilar, deve ter uma intensidade especial na Quaresma. Façamos exame de consciência sobre a nossa generosidade e gratuidade no amor fraterno, de modo particular os pobres, as pessoas idosas a braços com os limites impostos pela idade, tantas vezes privadas de carinho e afecto, vivendo uma solidão que não nos pode passar despercebida. Tenhamos, este ano, uma atenção especial aos emigrantes que nos rodeiam. Sejamos, para eles, um testemunho acolhedor de caridade fraterna.

6- Uma renúncia com sentido e destino. A partilha de bens materiais foi sempre uma expressão de "renúncia quaresmal", como afirmação de desprendimento e prioridade dada aos valores espirituais. A nossa Diocese tem já uma longa experiência de "renúncia quaresmal", habitualmente em favor de outras Igrejas mais pobres. Na Quaresma deste ano convido todos os cristãos da Diocese de Lisboa a serem generosos na renúncia, que se concretiza em partilha e oferta para a construção da "Casa de Espiritualidade Imaculado Coração de Maria", cuja construção se iniciará proximamente. É uma estrutura ao serviço da evangelização e do aprofundamento espiritual da vida cristã. A sua importância pastoral justifica que o destino da nossa partilha seja, este ano, uma obra da Diocese. Pelos frutos de autenticidade cristã que gerará, acabará por redundar em benefício de toda a Igreja.

7- Subamos a Jerusalém: durante o Ano Jubilar saboreámos a beleza da peregrinação. Iniciemos a Quaresma como uma peregrinação, não já para um Santuário Jubilar, mas para a celebração pascal, onde, espiritualmente entraremos, com Cristo, no santuário definitivo, a que Ele preside como Pontífice da Nova Aliança.

† JOSÉ, Patriarca de Lisboa


Fonte Ecclesia

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