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A Igreja Não Está a Liderar o Debate Sobre as Mulheres
2003-03-26 22:15:11

Em Junho de 2001, o Vaticano deu ordens para que Joan Chittister não falasse numa conferência sobre a ordenação de mulheres, que decorreu em Dublin. A teóloga, autora de mais de 20 livros, licenciada em psicologia social, desobedeceu, as 137 religiosas do seu mosteiro apoiaram-na na decisão e a questão ficou por aí. A convite do grupo português do movimento Nós Somos Igreja, Joan Chittister fala hoje, às 18h30, no auditório Victor de Sá da Universidade Lusófona (ao Campo Grande, em Lisboa), sobre "Um povo sacerdotal em tempo de falta de sacerdotes", no dia internacional dedicado à defesa da ordenação de mulheres.

PÚBLICO - A ordenação de mulheres só se deve defender por não haver padres suficientes?
JOAN CHITTISTER - Não. Isso não seria razão para promover a ordenação de mulheres. O sacerdócio não é um jogo de números. Não se determina se o sacerdócio é autêntico pelo número de padres que existem. Se houvesse um padre no mundo, seriam padres suficientes, porque essa seria a única pessoa qualificada para ser padre.

P. - Qual é então o argumento para defender a ordenação de mulheres?
R. - Tem que ver com o baptismo, com a humanidade, com a encarnação de Jesus. A pergunta teológica essencial deve ser se Jesus foi uma pessoa ou se foi apenas um homem. A encarnação tem a ver com a presença de Deus na condição humana. As mulheres também são humanas e podem ser discípulos consagrados, podem ser seguidoras plenas de Jesus.

P. - Mas um dos argumentos dos que se opõem à ordenação de mulheres é que Jesus só teve doze discípulos homens.
R. - Isso não faz sentido. Sabemos que Jesus foi seguido por mulheres para todo o lado. Os evangelhos são muito claros no facto de não haver homens a promover o início do ministério de Jesus. O Evangelho de Lucas é muito claro: Maria Madalena e as outras mulheres seguiam-no por todo o lado, apoiando-o com o que tinham.

Esta noção de que apenas havia doze apóstolos não tem nada que ver com o discipulado. É uma metáfora cristã para as novas doze tribos de Israel. E contam episódios em que havia 50 mil pessoas, incluindo mulheres e crianças. As mulheres estavam lá e Jesus não as mandou embora. Quando falou com a samaritana, ele disse-lhe: "Vai e fala à cidade, vai dizer às pessoas quem sou eu." Dá uma missão à mulher.

Os doze homens são um artifício teologicamente falso.

P. - O Papa João Paulo II já disse que o debate sobre o assunto está encerrado. Isto não é uma batalha perdida?
R. - Não. Na Igreja, os mais importantes temas sociais e teológicos foram objecto não de anos, mas de séculos de discussão. Discutimos, durante trezentos anos, a divindade de Jesus. O apóstolo Paulo escreveu: "Escravo, ama o teu senhor." E, até ao século XIX, a Igreja Católica nunca disse que a escravatura era imoral. Este tema é um assunto teológico encerrado? Não, todas as questões continuam abertas. Porque a revelação continua a acontecer, e a compreensão continua a aprofundar-se.

Há uma diferença grande entre quebrar a disciplina ou abordar um assunto. As mulheres na Igreja estão hoje, paciente e persistentemente, a insistir nesta questão. Sentem-na nos seus corações, vêem-na nas suas filhas e no mundo à sua volta. O problema é que a Igreja não está a liderar o tema das mulheres

P. - O Vaticano não quis que falasse sobre o tema...
R. - Para ser honesta, não sei porque há um problema. Só peço que uma questão importante seja discutida na Igreja. Não quero ser sacerdote. Sou uma freira beneditina, só isso. Mas acredito que há mulheres que se sentem chamadas ao sacerdócio. E não teremos uma Igreja plena até que seja tida em consideração esta questão. Não creio que o silêncio seja bom para a Igreja.

P. - Lecciona teologia ecuménica. Como avalia o actual momento do movimento ecuménico?
R. - Continua a ser conduzido ao nível académico, da teologia profissional, com várias questões a ser discutidas. Mas o mais interessante é que, ao nível do povo, o movimento ecuménico aconteceu.

P. - Trabalha num centro de espiritualidade. Há alguns mestres de espiritualidade contemporâneos?
R. - Claro: Dorothy Day, Thomas Merton, Martin Luther King. São grandes figuras contemporâneas que levaram o evangelho e a palavra de Deus à praça pública.

P. - A Igreja tem falta deste tipo de pessoas nos nossos dias?
R. - Não. Temos figuras espirituais destacadas nos nossos dias. A irmã Chavéz, líder do movimento hispânico nos Estados Unidos. Desmond Tutu, Mandela, um homem muito espiritual, [Vaclav] Havel. São pessoas motivadas por grande profundidade espiritual, grandes figuras cristãs. Também há importantes figuras budistas, como Maha Ghosananda, o supremo patriarca budista do Cambodja. Há um só Deus. E a vontade de Deus para a humanidade é o bem, não o mal, é a paz, não a guerra.

Fonte Público

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