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Sociedade - Contra o cinismo
2003-01-09 21:14:01

O ano de 2003 não vai ser fácil para a economia portuguesa. A conjuntura económica internacional já não era brilhante, quanto mais com a probabilidade de uma guerra no Iraque, de efeitos imprevisíveis... E a situação das finanças do Estado português não permite que daí venha um estímulo compensador.

Assim, o desemprego, que ainda não é muito elevado mas está a aumentar, vai continuar a subir. E muita gente terá dificuldades em encontrar trabalho, por falta de qualificações profissionais.

Julgo que a atitude certa perante tal evolução será a de olhar para a frente e não para trás. Ou seja, não é insistindo em modelos ultrapassados (por exemplo, nas indústrias de mão-de-obra barata, ou em leis laborais obsoletas, ou, ainda, no consumismo irresponsável dos últimos anos) que o país se poderá modernizar.
2003 terá de ser um ano de reformas profundas, sob pena de Portugal se auto-condenar a um atraso crescente em relação ao resto da Europa. Ora as reformas provocam sempre incómodos e descontentamentos. Importa discernir aquilo que serão porventura protestos legítimos contra a mudança, do que não passará de mero imobilismo interessado, por parte de quem lucra com o “status quo” à custa do bem comum.

Mas o progresso geral provoca sempre sacrificados, pessoas que se não adaptam, que ficam marginalizadas. Aí, os cristãos terão de manter acesa a chama da solidariedade. Muita gente precisará de ajuda. Entre eles, os imigrantes, até porque - com o desemprego a aumentar - poderão multiplicar-se reacções de racismo e de xenofobia. A Igreja portuguesa tem uma missão ética essencial a desempenhar nessa área.

E numa altura em que, mesmo em Portugal, os realmente pobres são minoria, crescentemente marginalizada pelo seu escasso peso político (muitos nem votam), cabe à Igreja lembrar que eles existem, embora se vejam pouco. Daí que seja de apoiar tudo o que signifique encaminhar ajudas do Estado para os pobres a sério, ainda que tal desagrade à maioria, isto é, à classe média. O rico e o pobre não podem - não devem - ser igualmente subsidiados (na saúde, por exemplo) pelo dinheiro de todos os contribuintes.

Entre as injustiças mais gritantes da nossa sociedade está a fuga aos impostos, que é possível a alguns mas não a outros (trabalhadores por contra de outrem, nomeadamente). Foi oportuna a referência do Sr. Cardeal Patriarca a este respeito, na homília de 1 de Janeiro. Julgo que esta pedagogia deve continuar e ampliar-se incluindo, em particular, a exigência de que o Estado se porte como pessoa de bem (o facto de tal não acontecer dá o alibi para as pessoas não se sentirem moralmente obrigadas a pagar impostos).

Mas o mais importante de tudo será contrariar um certo clima de cinismo que se instala na sociedade portuguesa. Parece haver corrupção por toda a parte, ninguém é sério, os políticos mentem... logo, vale tudo. Como lutar contra tal ambiente? Por palavras, com certeza, mas muito mais através de gestos proféticos. Deus queira que sejamos capazes de os ter em 2003.

Francisco Sarsfield Cabral
(Jornalista da Rádio Renascença)

Fonte Ecclesia

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