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Natal da crise
2002-11-12 21:11:30

Ainda mal terminado o tempo dos defuntos começa o Natal a fazer-se anunciar. Não nas igrejas, mas nos centros comerciais, nas armações para as luzes que vão quebrando a rotina da cidade.

Para um chinês desprevenido que chegue a qualquer um dos nossos aeroportos, a mensagem é simples: a gente destas bandas não tem novo ano lunar com panchões e foguetes. Tem o Natal, que quer dizer nascimento, não de Buda, mas de Cristo.


Possivelmente o nosso imaginário chinês sabe mais que muitos dos nossos pequenos e crescidos que no Natal nem se lembram que celebramos o nascimento de Cristo. É a época da família e das prendas, ou melhor, das prendas e da família. Já soam clarins de grande alarido acerca das facilidades de pagamento e outras hipóteses mil para mandar ao ar, de uma penada, o décimo terceiro mês.
E entretanto as grandes tensões sociais que, como tempestade, se anunciam: as greves e protestos contra a nova Lei laboral, os despedimentos em muitas empresas, o encerramento de outras, o desemprego inevitável, o caminhão aberto a arbitrariedades económicas, o aumento do custo de vida, o corte drástico na despesa pública, os puxões de orelha dos parceiros da Europa, a inflação que não se vê mas se sente, os orçamentos rectificativos que vão acontecer em consequência lógica da crise de desaceleração económica que vivemos de forma evidente e irrefutável.
Pode acontecer que tentemos viver como se nada se passasse e as pequenas extravagâncias natalícias surjam cobertas por uma cega confiança de que tudo, brevemente, vai ser como dantes.
Raramente colocamos na agenda da ascese cristã a austeridade assumida, a renúncia ao supérfluo, a atenção maior aos carenciados - ou ostensivos ou silenciosos - a partilha ainda que simples do nosso haver, a percepção das necessidades dos mais fracos discretamente escorraçados para a última fila da vida.
Nada de mal acontece se tivermos a cidade iluminada, em festa, para celebrar o Natal. Mas sabe-se que, em matéria de prendas, noventa por cento é tralha, puro desperdício destinado ao lixo. O tempo de crise pode ser propício a valorizar os gestos gratuitos em troca de objectos caros e inúteis. Bom momento para banir a idolatria das coisas.

António Rego

Fonte Ecclesia

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