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D. António pediu apoio dos bispos
2002-10-21 18:13:22

O BISPO do Porto, D. António Ferreira Gomes, que em 1958 escreveu a Salazar afrontando a política do Estado Novo, tentou convencer o cardeal-patriarca Manuel Gonçalves Cerejeira e todo o episcopado a subscreverem a carta que haveria de incendiar o ambiente político português. Cinquenta anos depois de D. António Ferreira Gomes ter tomado posse na diocese portuense (Outubro de 1952), o único bispo ainda vivo do colégio episcopal daquela época, D. David de Sousa, antigo arcebispo de Évora, revela que D. António «desejou que todos os bispos fossem solidários com ele e censurassem Salazar».

Uma solidariedade que nunca se juntou às razões do bispo do Porto, que exigiu de Salazar que os cidadãos fossem «sujeitos - e não objecto - da vida económica, social e política».

Para D. David de Sousa, «o sentimento de todos (os bispos) foi o de considerar que o documento de D. António era uma decisão imprópria para o episcopado, que não deveria intrometer-se na política».
Demonstrando não apenas a sua discordância pessoal com a decisão do então bispo do Porto, o arcebispo emérito de Évora sublinha: «Tentei dissuadi-lo de escrever a carta, até porque aquele gesto colocava numa situação delicada o próprio cardeal Cerejeira, que assumia a chefia da Igreja».

Mas o bispo do Porto não desistiu e decidiu, por conta própria, questionar o modelo de governação do regime corporativista.
A carta valeu-lhe o exílio durante onze anos, com o apoio do Vaticano, e, segundo o Núncio Apostólico (embaixador da Santa Sé) monsenhor Fustenberg, também o consentimento do episcopado português.

No entanto, esta versão, transmitida pelo Núncio ao então ministro dos Negócios estrangeiros, Franco Nogueira, é desmentida por D. David de Sousa: «Nunca o episcopado foi ouvido sobre o assunto, nem pelo Núncio nem pela Santa Sé».
O arcebispo emérito de Évora garante que «nunca os bispos concordaram com o afastamento de D. António da sua diocese ou mesmo com o seu exílio». D. António «foi apenas vítima dele próprio», salienta.

Tranquilidade oficial
D. António tentou cooptar todo o episcopado

O antigo arcebispo de Évora, actualmente com 90 anos, que também esteve nas reuniões do Concílio Vaticano II, rejeita que algum funcionário da diplomacia da Santa Sé tivesse abordado os bispos portugueses presentes naquela magna reunião para «tratar daquele assunto».

D. David de Sousa admite, todavia, que o Núncio, ao garantir que o «episcopado era concordante com o afastamento de D. António, pretendia dar confiança ao Governo e reforçar que nenhum dos bispos tinha que ver com o pensamento de D. António».
Tanto mais que, para o antigo arcebispo de Évora, a carta do bispo do Porto «não comprometia apenas o cardeal Cerejeira. Com ela estava-se a abrir as portas da Igreja à oposição». Por isso, D. David reforça: «Era necessário tranquilizar o Governo...». Antes, porém, já o cardeal Cerejeira sancionara o exílio de D. António, num discurso polémico .

Enganaram-se os bispos e o Núncio na avaliação. A carta de D. António despertou um movimento no interior da Igreja de oposição ao regime do Estado Novo. A consciência dos Direitos Humanos e, mais tarde, a interrogação sobre a legitimidade da Guerra Colonial geraram grupos católicos de interpelação, mesmo no interior dos próprios seminários.

Fonte Expresso

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