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O Testamento do Papa
2001-01-07 11:31:06

Um programa testamento do Papa-peregrino encerrou ontem as comemorações jubilares e conduziu a Igreja Católica ao terceiro milénio. Para trás ficou um ano no qual a influência espiritual e política do catolicismo saiu reforçada. Mas, feito o balanço, no interior da Igreja existe alguma insatisfação e o mundo laico interroga-se sobre as ambiguidades deste Jubileu. Só os crentes se renderam ao "annus mirabillis" de João Paulo II.

Foi perante uma multidão de cerca de 100 mil pessoas que João Paulo II encerrou ontem, em Roma, as celebrações do Grande Jubileu do Ano 2000. Feito o balanço, o Papa lançou as bases da actuação da Igreja Católica para o terceiro milénio: reforma das instituições, diálogo ecuménico e inter-religioso, defesa da vida perante os desafios da ética, empenho nas vocações e prioridade à missão evangelizadora em tempo de globalização.

O documento estruturado em quatro capítulos entrega às dioceses locais a tarefa de desenvolver e adaptar as especificidades do programa estabelecido pela Carta Apostólica "Terzo Millenium Ineunte". Ambiciosa, a Carta volta a propor uma reflexão sobre a eficácia do actual funcionamento das instituições da Igreja. João Paulo II pretende "valorizar os instrumentos do Vaticano II" e, embora admita que "já muito se fez quanto à reforma da Cúria Romana, à organização dos Sínodose ao funcionamento das Conferências Episcopais", refere que ainda há muito a fazer "para valorizar as potencialidades destes instrumentos" numa época que exige prontidão e uma "resposta eficaz aos problemas que a Igreja tem de enfrentar nas rápidas mudanças do nosso tempo". É nesta linha que o Papa pretende valorizar os organismos de participação da Igreja "tais como os Conselhos Presbiterais e Pastorais".

Uma das grandes prioridades da Carta Apostólica é a evangelização. "Hoje tem de se enfrentar com coragem uma situação que se vai tornando cada vez mais variada e difícil com a progressiva mistura de povos e culturas que caracteriza o novo contexto da globalização", afirma o Papa.

Daí a "exigência de inculturação" e da necessidade de um novo impulso missionário que "não poderá ser delegado a um grupo de especialistas". Deve ser encarado como um compromisso, de modo a instituir o cristianismo como "o rosto das diversas culturas e dos vários povos onde for acolhido". Neste quadro de abertura, o documento convoca de novo as grandes paixões do Papa polaco: o empenho ecuménico e o diálogo inter-religioso. Wojtila volta a recorrer à metáfora da "Igreja dos dois pulmões" para justificar a comunhão com as igrejas do Oriente e com "os irmãos e irmãs" anglicanos e comunidades nascidas da Reforma. O apelo nasce da convicção do Papa de que "o confronto teológico sobre pontos essenciais da fé e da moral cristã não deixarão de produzir os seus frutos".

A Igreja não pode ceder
O tema da família e mais genericamente das questões da vida entrecruzam-se no documento. João Paulo II recomenda uma promoção das vocações do sacerdócio e alerta para a necessidade de estruturar uma pastoral das vocações - que envolva paróquias e famílias e permita "uma reflexão mais atenta sobre os valores essenciais da vida". Por isso, aconselha uma especial atenção à família numa "época de crise radical desta instituição".

É sobre este ponto que o documento pontifício cerra fileiras. Diz que a Igreja "não pode ceder às pressões de determinada cultura, ainda que generalizada e agressiva", e que os crentes devem empenhar-se "no respeito da vida de cada ser humano, desde a concepção até ao seu ocaso natural". Principalmente, quando as novas potencialidades da ciência questionam as "exigências fundamentais da ética". Uma tarefa que cabe aos leigos desenvolver mas, adverte o Papa, sem ceder "à tentação de tranformar as comunidades cristãs em agências sociais".

Controvérsias e amargura
Ontem, durante a homilia na Praça de São Pedro, o Papa, no balanço do Ano Jubilar, referiu-se ao problema da dívida internacional dos países pobres. Com optimismo, afirmou que "os parlamentos de muitos estados credores votaram um substancial perdão da dívida bilateral" e que a dívida dos países mais deprimidos a organismos internacionais "já se apresentou mais problemática". O optimismo do Pontífice não conseguiu apagar a sensação de amargura que, sobre este ponto, exprimiram alguns expoentes da Igreja. (ver caixa)

Outra das fontes de descontentamento diz respeito aos pedidos de amnistia dos detidos lançados durante o Ano Jubilar e que caíram em saco roto. O mediático arcebispo emerito de Ravena, Ersilio Tonini, e o influente cardeal de Milão, Carlo Maria Martini, considerado por muitos uma espécie de Papa doméstico italiano, lamentaram a "surdez e incapacidade dos políticos de compreenderem os problemas reais".

O balanço oficial da Igreja sobre o Ano Jubilar é positivo, mas, do inventário oficioso, ressaltam ásperas polémicas suscitadas pela declaração "Dominus Jesus" sobre a supremacia dos católicos pelo "Gay Pride", ou a beatificação de Pio IX. E há interrogações pesadas que os laicos deixam no ar. "Depois deste Jubileu, o Papa, vigário de Cristo na Terra, é mais conhecido, mas em que é que a Igreja está agora mais próxima do seu fundador?", interroga-se o especialista em questões religiosas do diário "Il Manifesto".

Fonte Público

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