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Igreja ainda tem a tentação de conquistar os poderes
2000-11-10 20:19:11

"A Igreja ainda hoje terá a tentação de conquistar o poder. É uma tentação que, por vezes, passa pela cabeça de muita gente, mas, ao verificarem as dificuldades, logo desistem". A afirmação é do patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, no encerramento do primeiro dia do colóquio sobre Cristianismo e Comunicação que ontem se iniciou no Mosteiro de S. Vicente de Fora, em Lisboa.

O bispo, no contexto das reflexões anteriormente explanadas, referia-se ao poder da comunicação social fortificado pelas novas tecnologias. Um poder que pode conduzir a "cenários catastróficos", assinalados por alguns dos oradores, como a despersonalização, a solidão, ou o domínio das sociedades por parte de grandes grupos económicos proprietários dos media. Para o bispo, "o grito do Ipiranga ter-se-ia de soltar se porventura esses cenários se realizassem". E frisou: "O homem reagirá sempre a qual coisa que o impeça de ser homem".

No entanto, é necessário reconhecer existência das novas formas de poder, o que, segundo D. José, deve incentivar a Igreja Católica a equacionar o seu relacionamento com elas. O prelado apresentou três perspectivas. A primeira seria a de as tentar conquistar. Ao longo dos séculos "já alguma vez o conseguiu, mas não foi muito feliz". A segunda, seria a de tentar "compatibilizar-se, no sentido de se encontrar um equilíbrio de poderes, evitando os ataques e servindo-se deles para realizar a sua missão". A terceira perspectiva seria a de assumir, perante esses poderes, uma atitude de liberdade evangélica", apresentando "a verdade catalogada nas bem-aventuranças".

Para D. José, a Igreja deve enfrentar o desafio da liberdade evangélica: "contrapondo o testemunho" aos "discursos sem mensagem", defendendo a "osmose da intersubjectividade", quando os "meios separam os interlocutores", apoiando as "microrealidades", se o cultivo for o da "massificação". Na opinião do bispo, a comunicação social "só tem sentido ao serviço da liberdade e da corresponsabilidade".

Estas palavras foram antecedidas pelas intervenções do director de informação da Rádio Renascença (RR), José Luís Ramos, e do director da SIC, Emídio Rangel, durante o painel "O Caso Português: Intervenção Mediática e/ou Presença Inspiradora", coordenado pelo editor executivo adjunto do DN, José António Santos.

José Luís Ramos salientou algumas questões mais polémicas do panorama mediático. Segundo o orador, "o desafio que se coloca aos comunicadores inspirados por um forte pendor ético e humano, e preparados de forma profissional, é o de serem capazes de resistir no mercado actual da comunicação, a atalhar caminho por outras vias mais fáceis, rumo ao sucesso rápido da audiência, à volúpia da influência, quando não pelo caminho do domínio expressivo de um mercado ou de nichos desse mercado, em que o lucro é o critério primeiro e último da comunicação, determinando-o no conteúdo e na forma".

A obtenção de lucro, na perspectiva do director de informação da RR, "é um objectivo legítimo para qualquer empresa". Porém, é sua convicção que "a natureza de certas actividades delimita e confere outro tipo de responsabilidade social que não pode ser avaliada pelo mesmo padrão dos negócios de canetas ou do vestuário". A negação desta verdade só "facilita a vida de quem anda na comunicação sem vocação, e anestesia a consciência dos que se sentem obrigados a colaborar, sem concordar, com tais procedimentos", sublinhou. O orador defendeu ainda que "a comunicação desligada do cenceito de serviço converte-se num tempo de antena de interesses, em que não há lugar à esperança nem espaço para ajudar o Homem a impor e a lutar em nome da dignidade".

O teor da comunicação de Emídio Rangel trilhou caminnhos completamente diferentes. O director da SIC exaltou sobretudo os meios de comunicação que possibilitam a interactividade, o conhecimento, a informação do que se passa no lado do mundo "sem a lógica da mensagem única". Adiantou que "estamos distantes do tempo em que a comunicação social era palco só de alguns", vivendo-se agora "o tempo da participação dos cidadãos". Na sua óptica, nenhum meio de comunicação "tem o poder de controlar as consciências das pessoas", considerando que "estas têm múltiplas maneiras de formar os seus próprios juízos". Neste sentido, referiu que a Igreja Católica não deve esquecer esta realidade, aconselhando-a a expôr-se através desses meios para que se apresente também ela como contributo para a formação de juízos de valor.

Este colóquio, que reúne católicos e agnósticos, termina hoje com uma comunicação do arcebispo Patrick Foley, presidente do conselho pontifício para as comunicações sociais da Igreja, seguindo-se os comentários de Mário Soares e Adriano Moreira.

Fonte DN

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