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Vestes de Nosso Senhor em Guimarães
2002-03-10 17:23:35

Majestosa e silenciosamente exposto no Museu Alberto Sampaio, em Guimarães, descobriu-se agora que o pequeno cobre-relicário do século XV, de prata dourada, escondia há mais quatro séculos segredos preciosos da história, cultura e fé.


Foi admirado durante décadas, e reconhecido como peça maior da ouriversaria medieval portuguesa. Perfeito em engenho e arte de mãos anónimas, a sua perfeição e beleza tinha-o "empurrado", inclusive, para grandes exposições internacionais. Saíu, pela primeira vez, em 1924. Preparavam-no agora para ir a Itália, mais concretamente a Rimini, cidade onde sepultaram João XXI, o único Papa português.

A responsável pelo Museu, Isabel Maria Fernandes, sempre o contemplava carinho, mas algo lhe dizia que algum recheio deveria haver no seu interior. Até que um dia, na companhia de outros conservadores de museus, resolveu dar azo à curiosidade.

Surpreendentemente, depararam-se com 90 relíquias, divididas em três grupos. O mais antigo é um estojo em couro, contendo duas caixas em madeira e uma em osso, todas com inscrições góticas. O segundo, corresponde, provavelmente, a uma doação real feita pelo rei D. João I. Trata-se de uma caixa, em cuja tampa policromada estão gravadas as suas armas e as de sua esposa, D. Filipa de Lencastre. O terceiro grupo é um embrulho com uma bula do Papa Gregório XIII, escrita num pergaminho de carneiro, ainda com o respectivo selo pontifício em cera. Junto estão alguns tecidos medievais, em linho, seda e lã, jamais vistos em Portugal.

Afinal, aquele cofre era, de facto, uma autêntica lipsanoteca. Toda a gente sabia que teria servido para guardar relíquias, mas ninguém acreditava que pudessem estar ainda ali.

E sabia-se porque o próprio cofre o tinha desvendado. De facto, na sua face principal da parte exterior pode ler-se, em caracteres góticos, que no ano de 1457 o prior da Igreja de Nossa Senhora de Oliveira, D. Luís Vasques da Cunha, descobriu um conjunto importante de relíquias. E explica-se que, entre elas, se encontrava roupa de Nosso Senhor e partes do véu de santa Maria, assim como vestes de apóstolos e mártires, e de outros santos e santas.

Está assim justificada a presença de tecidos no interior daquela obra de arte, cuja tampa mostra uma decoração vegetalista estilizada com o nome Ihesus encimado pelo nome de Maria. De lado, estão gravadas as armas de D. Luís Vasques. Esta gravação terá sido inserida numa fase posterior. Sabe-se também que a fechadura, com o puxador e a chave, obra do ourives Bento de Antes, foi mandada colocar ali em 1664. Foi nesse ano, dizem os especialistas, que o cofre se fechou pela última vez.

Estas relíquias transportam-nos hoje para uma espiritualidade muito característica da Idade Média. Mas independentemente dos juízos de valor que se façam acerca daquele tipo de religiosidade, as relíquias de Guimarães, para além de proporcionarem ao estudiosos a análise dos materiais, são memória da cultura e fé de Portugal. São, por isso, património legado pelos antepassados, cuja preservação é também sinal de respeito pela história.

O tesouro foi agora apresentado em Guimarães graças ao saber técnico e científico de quem trabalham no Instituto Português de Conservação e Restauro. A maior parte das peças foi ali estudada e datada, e sobre ela já foi dado conhecimento ao mundo através da Revue de L'Art, num artigo escrito por Alexandra Curvelo e Mário Pereira. Outros materiais, provavelmente mais antigos do que a Nação, vão ser enviados para os Estados Unidos para uma datação precisa. Desta forma, a arte e a fé, que são memória histórico-cultural, continuam a surpreender.

Fonte DN

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