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O protagonismo das famílias à luz da Familiaris Consortio
2001-11-22 21:41:33

Comentário de P. José João Aires Lobato, Secretário da Comissão Episcopal da Família



A Exortação Apostólica de João Paulo II sobre a Família e a pastoral familiar marca, indiscutivelmente, uma etapa nova no Magistério da Igreja sobre esta temática, não porque tenha introduzido nova doutrina, nem focado problemas muito diferentes daqueles que já tinham sido anteriormente tratados. A grande novidade da Exortação está na abertura de uma nova perspectiva da hierarquia perante a família: para além da solicitude dos pastores pela instituição familiar que importa defender e promover, é feito um convite muito claro e insistente às famílias para que assumam, na Igreja e no mundo, a sua missão, traduzida em funções muito concretas e variadas.
Quem deu o primeiro passo na abertura desta perspectiva foi Paulo VI na Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi, especialmente no que toca à evangelização, atribuindo à família a missão de evan-gelização dos seus membros e de outras famílias, como consequência da sua natureza de "igreja doméstica" (cf. n.º 71).
Foi, porém, o Sínodo dos Bispos sobre a Família, em 1980, que levou até ao Santo Padre esta insistência no papel das famílias na missão da Igreja, quer na vida interna das comunidades, quer na intervenção na sociedade e na cultura. A Mensagem dos Bispos (25.10.1980) refere este aspecto que João Paulo II incluíu na III parte da Familiaris Consortio, a mais extensa de todo o documento e como que o seu núcleo central. Também na IV parte - sobre a pastoral familiar - o Papa, ao referir os agentes e as acções prioritárias, sublinha o papel preferencial que cabe aos casais e às famílias na acção pastoral da Igreja para com as famílias (cf. n.º 71).
Passados 20 anos da publicação desta Exortação (22.11.1981), é necessário reconhecer que, embora muito se tenha reflectido sobre a missão das famílias cristãs na Igreja e no mundo, à luz da FC, muito pouco se avançou na prática. E porquê?
O espaço da acção pastoral é a comunidade local, onde as pessoas se cruzam, se encontram e desencontram, onde a missão da Igreja toma corpo, onde o Evangelho se torna vida, alimentando as relações humanas, as práticas diárias e os critérios de vida, etc. A grande expectativa para pôr em prática as orientações da Familiaris consortio estava no rejuvescimento e consolidação das paróquias como comunidades mais "familiares", "famílias de famílias". Nelas, cada família cresceria na consciência e na prática de uma verdadeira "igreja doméstica", numa espiritualidade de verdadeira comunidade de amor e de vida, não intimista, mas aberta às outras famílias. Com base neste "sonho", pensou-se que toda a vida comunitária - desde a catequese à acção sócio-caritativa, da liturgia e a oração à intervenção nas escolas, da formação permanente ao compromisso político - tudo envolveria as famílias e seria por elas assumido como expressão da sua fecundidade, a partir da sua "qualidade" eclesial (igreja doméstica) e social (célula primeira e vital da sociedade).
Não foi, porém, isso que aconteceu. Continuamos com uma prática pastoral mais ligada às respostas imediatas a problemas do quotidiano, que são certamente importantes; preparamos, o melhor que sabemos e podemos, acções dirigidas às famílias cristãs; mas não temos tido muito cuidado em fomentar, de forma perseverante e sistemática, experiências gratificantes de vida cristã com as famílias, com as suas dificuldades e dramas, as suas esperanças e alegrias, reunindo-as, abrindo-lhes o coração para o Evangelho e para a Pessoa de Jesus Cristo, propondo-lhes itinerários de fé, mas também criando as condições para que elas assumam, de forma criativa, responsável e perseverante a sua missão, concretamente a da prática da solicitude de umas pelas outras, em especial as que vivem em situações de maior sofrimento. E isto sem as deslocar do ambiente onde vivem, onde choram e riem, onde experimentam talvez uma grande solidão.
Também é verdade que muitas famílias cristãs ainda vivem instaladas na posição de "receptoras" dos serviços que a pastoral familiar das dioceses e paróquias lhes oferece, muitas vezes lamentando a pouca atenção "da Igreja" para com a família e desejando que houvesse mais iniciativas... tomadas pelos outros. Também elas têm de fazer um percurso de consciencialização da sua vocação e missão, da sua responsabilidade e do seu protagonismo.
A pastoral familiar que incentive o protagonismo das famílias depende, certamente, de uma re-invenção da pastoral para que todos somos chamados e responsabilizados.
O protagonismo das famílias na vida e na missão da Igreja foi, há 20 anos anunciado, proposto, recomendado pelo Santo Padre. Que a celebração do 20.º aniversário da Familiaris Consortio proporcione uma re-flexão sobre tudo isto, para que venha a tornar-se realidade num futuro próximo.

P. José João Aires Lobato
Secretário da Comissão
Episcopal da Família


Fonte Ecclesia

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