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Teólogo Propõe Fátima como Crítica do Poder
2001-05-10 16:01:03

A urgência de uma "revolução cultural mundial" que coloque as vítimas e os explorados no centro das preocupações da sociedade foi defendida ontem, em Fátima, pelo teólogo e professor da Universidade Católica José Jacinto Farias.

Na abertura do congresso internacional sobre o tema "Do sacrifício de Cristo à dimensão sacrificial da existência cristã", que decorre até sábado na cidade-santuário, Jacinto Farias apelou ainda a que se aproveitem as potencialidades de Fátima para realizar "uma crítica da cultura e do poder".

Citado pela Lusa, o padre Jacinto Farias admite a crise da filosofia crítica e da teologia da libertação. Por isso nunca terá sido tão necessário como nos dias de hoje dar voz aos oprimidos, impondo-se "a urgência de uma nova teologia da revolução não violenta, com tanta ou mais actualidade do que nos já longínquos anos 60".

Em declarações ao PÚBLICO, João Duque, também professor da Universidade Católica, no pólo de Braga, diz que são necessários, no mundo ocidental, modelos teológicos que partam do mesmo pressuposto da teologia da libertação. Esta corrente, surgida nos anos 60 do século XX na América Latina, tomava a solidariedade com os mais pobres como a forma de viver o cristianismo. "Seria necessário, na Europa, que a teologia estivesse aberta aos fenómenos de marginalização que se vivem nas nossas sociedades". Uma atitude que, admite, tem estado longe da teologia que se faz no mundo ocidental, a qual, no entanto, segue modelos de análise caros à teologia da libertação.

Para Jacinto Farias, é mesmo necessária uma nova "epistemologia das ciências e da história" que parta da vivência "dos sacrificados, as vítimas inocentes, e não dos vencedores e dos oportunistas de todos os tempos".

João Duque, 37 anos, casado e pai de duas crianças, justifica o tema do congresso como uma forma de "enfrentar, sem medo, a realidade cultural; que tende a fazer de conta que o sofrimento não existe. "Todos fazemos a experiência do sofrimento, mas há a tendência para o encobrir ou desviar. estamos sujeitos à violência, ao sofrimento, à morte, mas criámos um tabu à volta dessa realidade".

A iniciativa também pretende questionar os modos de a religiosidade popular enfrentar o sacrifício. "Fazer a elucidação teológica do sacrifício, respeitando a sensibilidade popular mas dando uma alternativa" é o objectivo de alguns dos temas em debate. "Entender o sacrifício como uma relação de solidariedade com as vítimas que mais sofrem" é um modo de olhar que pode dar outro sentido a manifestações de religiosidade como as que muitas vezes se vêem em Fátima.

O cristianismo, explica João Duque, encara o sofrimento como algo absurdo, que é necessário ultrapassar. Uma porta aberta para a compreensão da eutanásia, por exemplo? O teólogo não vai tão longe - "muitas vezes, a defesa da eutanásia tem mais a ver com a fuga do sofrimento" -, mas "sem esperança, é difícil assumir esse absurdo". Por isso é que a Igreja propõe "que cada pessoa se assuma na sua realidade sofredora". E daí o entendimento do cristianismo de que a "última palavra não será do absurdo e do sofrimento", ao contrário da perspectiva dos existencialistas.

O congresso conta com a participação de teólogos portugueses e estrangeiros, incluindo vários nomes importantes da teologia protestante. Entre os nomes mais destacados, estão os do luterano alemão Wohlfarht Panneberg, e dos católicos Jörg Splett (Alemanha), Hallonsten (Suécia, ex-luterano), Hervé Legrand (França) e Alsdair John Milbank (um dos mais importantes teólogos americanos da actualidade).

As participações ecuménicas deste congresso são, aliás, uma das marcas mais importantes da iniciativa. A sua realização em Fátima deve-se também, de acordo com Jacinto Farias, ao facto de o lugar ser um "espaço de silêncio e de simplicidade, refractário e rebarbativo a qualquer tipo de ostentação ou de poder", porque nele se respira "uma atmosfera que é crítica ao poder ou à sua ostentação".

Fonte Público

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