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Bispo de Aveiro faz sermões aos turistas
2000-08-16 20:35:01

Se os veraneantes não vão à igreja, vai a Igreja ao seu encontro. Esta é a ideia que preside à invulgar acção pastoral que o bispo de Aveiro, D. António Marcelino, pretende desenvolver, até ao final desta época estival, nas localidades da sua diocese com vocação turística. O bispo, que garante não ir ao areal «incomodar as pessoas com a Bíblia debaixo do braço, à semelhança das Testemunhas de Jeová», iniciou na quarta-feira um programa de encontros com turistas, tentando dinamizar uma área de evangelização que a Igreja, «pela sua incapacidade de lidar com o fenómeno da mobilidade associado ao turismo», tende a esquecer.


D. António Marcelino não quer ser «um bispo do poder, um mero administrativo» e, por isso, promove estas iniciativas, que nada têm de celebração religiosa. São encontros voltados para o diálogo e para a reflexão, que pretendem, segundo o responsável da diocese aveirense, proporcionar aos turistas um espaço, quer de contacto com a religião - por forma a combater o afastamento dos cristãos da missa durante o Verão -, quer de busca de «satisfação espiritual fora das celebrações normais da Igreja».

Às sessões acorrem velhos e novos. Mais uns do que outros, dependendo da vocação turística da terra onde se realizam os encontros. E, em verdadeiras aulas de catequese, D. António Marcelino tenta incentivar todos a ajudarem o próximo, porque, garante, «onde há fome a mais, há missas a mais».

O Salão do Turismo da Curia foi o palco do primeiro encontro e acolheu, na noite de quarta-feira, perto de 50 pessoas. Eram sobretudo idosos, vindos de vários pontos do país. «Este era o público que esperava aqui encontrar, visto estarmos numa estância termal», argumenta o bispo. Mas, no dia seguinte, na freguesia da Barra, uma das muitas terras balneares da diocese, a assistência já contemplava muitos jovens. O parque de campismo anexo ao centro social da paróquia, o local previamente escolhido para a reunião, foi, nesse aspecto, uma preciosa ajuda. Nas várias situações, se havia alguém à espera de um senhor vestido de branco e rodeado de assistentes, desenganou-se rapidamente. À hora marcada, o bispo chegou, sozinho e ao volante do seu próprio carro, trajando calças casuais e uma pólo listada, como se de um turista se tratasse. «Não é o hábito que faz o monge», justifica.


Culto individualista e retrógrado
Unânime, entre jovens e idosos, parece ser a justificação da ida aos encontros. «Este é um espaço alternativo, que proporciona maior substância emocional e espiritual», sublinha Maria Vicente, que com 73 anos se deslocou de Alcanena até às termas da Curia.
Um pensamento partilhado por Ana Teixeira, estudante portuense de 17 anos, que se encontra a passar férias na praia da Barra: «O que venho procurar é uma nova forma de encarar o mundo. O discurso que encontro na minha paróquia é demasiado retrógrado». Este é um sentimento que parece estar a generalizar-se e, por isso, foram postos a nu, nos vários encontros, os aspectos menos aliciantes do dia-a-dia das paróquias.

A falta de humanização das relações foi uma das lacunas mais referenciadas e, segundo o próprio bispo, o culto não a combate porque não promove o relacionamento interpessoal: «As cerimónias religiosas e a oração alimentam o isolamento, pelo que o verdadeiro cristão não é aquele que vai às missas todas, mas aquele que também se interessa por viver à luz dos ensinamentos de Jesus, ou seja, sendo solidário».

Com 70 anos, D. António Marcelino - um bispo que no último ano deu a cara em casos polémicos, como a defesa do pároco da Gafanha da Nazaré, contestado pela população, ou a oposição à abertura em Aveiro de uma loja de material erótico -, não faz férias em Agosto para se poder dedicar aos turistas.

Este religioso, natural de Castelo Branco, sensibilizou-se para o turismo quando era bispo auxiliar de Lisboa, com a responsabilidade da zona do oeste, que tem na Nazaré uma das principais praias. Está em Aveiro há cerca de 20 anos e encontrou aí uma vasta frente de praias e várias estâncias termais, bons terrenos para explanar a sua inclinação para o turismo. Por isso, não se cansa de promover encontros com veraneantes. Só lamentando que os párocos da sua e de outras dioceses não estejam «para aí virados».

A pastoral do turismo, uma actividade que a Igreja Católica decidiu desenvolver logo após o Concílio do Vaticano II, em 1965, não tem grande tradição em Portugal.

As iniciativas surgem isoladas, embora exista desde 1968 a vontade de elaboração de um plano nacional. Os bispos chegaram a reunir-se várias vezes, em 1967 e em 1973, com o intuito de prepararem a criação de um órgão nacional para o sector, mas até hoje nada se concretizou.

Em Lisboa, os elementos do Serviço das Migrações e Turismo da diocese estão de férias durante o mês de Agosto. E, no Porto, o Secretariado das Migrações, que funciona apenas há um ano, não tem acção concertada na área do turismo.


Fonte Expresso

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